Governo estaduais vêm garantindo arrecadação extra ao não repassar ao ICMS as variações do preço da gasolina nas bombas. A estratégia é vista pelo setor como uma manobra para enfrentar a crise financeira em detrimento do consumidor.
O ICMS sobre a gasolina é cobrado nas refinarias, com base em um preço de referência, conhecido como PMPF (preço médio ponderado final), ou preço de pauta. Ele é definido a cada 15 dias por cada governo estadual e publicado pelo Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária).
Geralmente, os estados consideram a pesquisa de preços da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis) para estipular o PMPF. Em alguns casos, a decisão se baseia em pesquisas próprias a partir de notas fiscais eletrônicas de venda de combustíveis.
Ao perceber que, em Pernambuco, o preço de pauta se manteve estável em R$ 4,60 por litro durante todo o ano, a deputada estadual pernambucana Priscila Krause (DEM) levantou o movimento em outros estados e identificou comportamento parecido na Bahia e no Ceará.
Em Tocantins, Minas Gerais e no Espírito Santo, houve mais variações, mas o PMPF também passou longos períodos sem mudanças. Em Minas, por exemplo, o preço de referência esteve sempre bem acima do preço médio calculado pela ANP.
“É uma busca para inflar a arrecadação”, diz Krause. Ao manter o PMPF muito acima do preço de bomba, diz ela, o estado, na prática, aumenta a alíquota de ICMS sobre o produto -já que está cobrando a alíquota prevista em lei sobre um valor maior do que o praticado nas bombas.
Em Pernambuco, ela calcula que o ganho extra do estado já chegue a perto de R$ 100 milhões no ano. Em Minas, onde está a maior diferença, a arrecadação adicional superaria R$ 236 milhões. A conta considera o volume de gasolina vendida durante o ano.
O ganho foi maior no início do ano, quando o preço da gasolina nas bombas estava mais baixo. O valor subiu até atingir o pico em maio, reduzindo –e, nos casos de Ceará, Espírito Santo e Tocantins, eliminando– a vantagem, mas voltou a cair até o início do segundo semestre.
Nas últimas semanas, a gasolina voltou a subir nas bombas, em resposta a dois reajustes promovidos pela Petrobras em suas refinarias para acomodar a escalada do dólar. A política de preços da estatal considera o conceito de paridade de importação, que inclui as cotações internacionais mais custos para trazer o produto.
Estados ouvidos pela reportagem negam que o cálculo do ICMS tenha por objetivo ampliar a arrecadação. “O estado não faz a correção no mesmo ritmo das oscilações registradas nos postos porque costuma aguardar que o preço se estabilize em determinado patamar”, disse, em nota, o governo da Bahia.
O Ceará disse que os preços da Petrobras têm oscilado muito e, diante disso, “decidiu manter uma média de preço estável e comparável com os estados vizinhos, visando segurança e estabilidade nas relações de consumo”.
O governo de Minas Gerais afirma que seu cálculo usa “dados consistentes” e considera a média aritmética ponderada por posto. considerando o volume vendido. Até setembro, diz, fazia pesquisa diretamente nos postos. Agora, usa notas fiscais eletrônicas.
Já o governo do Espírito Santo afirmou que fez poucas modificações durante o ano porque os preços oscilaram pouco e diz que usa amostragem mais completa do que a pesquisa de preços da ANP, que visita 16% dos postos do estado.
Pernambuco e Tocantins não responderam à reportagem. Em 2019, até outubro, a arrecadação sobre os combustíveis rendeu R$ 73,20 bilhões aos estados, segundo dados do Confaz. O número representa aumento de 3% com relação ao mesmo período do ano anterior.
No Ceará (22,5%), no Espírito Santo (18,3%) em Pernambuco (10,7%) e no Tocantins (10,3%), o aumento foi maior que a média. Na Bahia, a receita aumentou 2,9% e, em Minas Gerais, houve queda de 1,1%. Os valores incluem todos os combustíveis.
Conhecido como substituição tributária, o modelo de cobrança antecipada do imposto ainda nas refinarias sobre um preço de referência estipulado previamente, tem por objetivo facilitar a fiscalização, já que o Brasil tem cerca de 40.000 postos de gasolina.
É alvo de ações judiciais por donos de postos, que buscam reaver os valores pagos a mais na compra do combustível, e vinha sendo debatido no Confaz antes da mudança do governo. As distribuidoras de combustíveis defendem a mudança para uma alíquota única, em reais por litro, ao invés de percentual sobre o preço final.
Elas argumentam que esse modelo traria maior previsibilidade aos estados, além de reduzir o potencial de fraudes. A discussão, porém, não encontra consenso e foi suspensa à espera dos debates sobre a reforma tributária.
Fonte: Bocão News